laralice in wonderland

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quarta-feira, março 09, 2005

O Midas anda com a Rosa

O Midas anda com a Rosa, embora ela esteja há muito tempo apaixonada por outro rapaz chamado Néri, que é giro e simpático. Mas toda a gente diz que ele agora gosta de rapazes. A Rosa recusa-se a acreditar nisso, como se fosse impossível, pois conheceu-o bem e sabe que ele gosta de raparigas. Será que ela nunca ouviu falar de bissexualidade? O Midas, pelo menos, já ouviu falar de poligamia, pois para além de mim e da Rosa ainda gosta da Ágata. Na associação de estudantes inauguramos a “Rádio É”, limpamos a sala de convívio, e todos sentimos que precisamos de algo para fazer juntos, pois andamos enfadados. A Ema diz que necessita de outro Festival da Paz. Eu a Laura deambulamos pelo bairro sozinhas todas as noites, e numa delas encontramos o Vilmo. Fumamos um charro com ele na igreja. Depois eu o Vilmo levamos a Laura até ao Jardim da Parada, ela vai para casa e ele acompanha-me até à minha rua. Despeço-me dele e subo as escadas do meu prédio às escuras, não sei porquê, talvez por achar que assim faço menos barulho e não acordo o meu pai. Antes de chegar ao meu patamar, subitamente, fico na dúvida se estou acordada ou a sonhar. Isto nunca me tinha acontecido. Mas concluo que estou acordada e que, depois de tanto tempo, finalmente fumei um charro que me fez efeito. Abro a porta da entrada e vejo a luz do quarto do meu pai acesa ao fundo do corredor. Tento caminhar calmamente, mas sinto-me alterada e o corredor escuro com a luz ao fundo começa a dar-me vontade de rir. O meu pai está sentado à secretária a desenhar, a fumar cigarros, e a beber cerveja. Devem ser umas duas da manhã. Sinto-me como se fosse desmaiar a qualquer momento e tento disfarçar para ele não perceber. Bato levemente na sua porta e digo-lhe, com uma voz alegre e um sorriso:
- Boa noite. Tudo bem?
- Sim, e tu?
- Estou com sono, vou-me deitar.
- Então dorme bem.
- Obrigada. Até amanhã.
Entro para o meu quarto e dispo-me rapidamente. Deito-me convencida de que vou adormecer e assim esquecer que estou pedrada e evitar que o meu pai descubra alguma coisa. Mas daí a pouco o meu coração começa a bater aceleradamente, e faz tanto barulho que fico na dúvida se o meu pai o poderá ouvir também, no quarto ao lado. Para além disso, receio que me esteja a dar um ataque cardíaco ou algo parecido, e apesar de não estar muito contente com a minha vida não me apetece morrer agora. Sento-me na cama para ver se o meu coração se acalma, mas não. Então penso que mal por mal mais vale ir falar com o meu pai sobre isto. Levanto-me e volto a bater-lhe à porta, que está entreaberta:
- Sim?
Ele continua sentado à secretária a beber cerveja e a fumar cigarros.
- Fumei um charro e agora não sei se me estou a sentir bem.
Ele levanta-se, com um ar preocupado.
- Um charro de quê? Queres ir ao hospital?
- Não, acho que não. De haxixe. Só gostava de saber se o que estou a sentir é normal.
- O que é que sentes? Dói-te a barriga? Queres vomitar?
- Não.
Sento-me em cima da sua cama e encosto-me às suas almofadas, relaxadamente, com as pernas cruzadas e um ligeiro sorriso idiota. Digo:
- Se eu soubesse que isto não era perigoso até me estava a divertir.
Ele pega no telefone e põe-se a marcar um número. Eu acrescento:
- Agora estou a ver tudo às bolinhas...
- Estou? Lia? Olha, a tua filha agora droga-se! Acho que é melhor falares tu com ela porque eu cá não percebo nada disto.
Passa-me o telefone e a minha mãe está do outro lado da linha, com voz de sono:
- O que foi, Alice?
- Fumei um charro.
- Sabes que horas são aqui? Estás bem?
- Acho que sim.
- Com quem é que fumaste?
- Com uma amiga.
- Então e foste contar ao teu pai?
- Sim.
- Vai-te deitar, isso passa, não tenhas medo.
- Está bem.
- Depois falamos.
- Até amanhã.
Desligo e levanto-me da cama.
- Estou melhor. Vou comer.
Na cozinha preparo um pão com Nucrema e bebo um copo de leite gelado. Depois fico com sono, enquanto mastigo o pão, novamente sentada na cama do meu pai. Anuncio:
- Vou-me deitar.
- Tens a certeza?
- Tenho.
Fica parado a olhar para mim, e como ainda está assustado deixa-me ir sem dizer mais nada. Daí a pouco, quando já estou deitada e quase a adormecer, sinto-o entrar no meu quarto. Põe-me a mão na testa, pergunta-me se estou bem, respondo-lhe que sim e vai-se embora. Adormeço.

1 Comments:

At 12:12 da manhã, Blogger goatchild said...

BRUTAL...
boa onda, gostava que os meus pais fossem assim...
lol

 

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